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Suicídio de padres na França expõe solidão presbiteral

Suicídio de padres na França expõe solidão presbiteral.

Suicídio de padres de pastores dedicados ao seu ministério assusta.
Bispo reage à morte de dois padre próximos questionando-se pessoalmente, ‘O que eu não fiz?, e como Igreja, ‘Ouvimos seu pedido de ajuda?’

O desespero de um padre é algo particularmente triste.

Dois padres suicidiram-se na França na última semana, com um intervalo de três dias.
Ambos estavam na casa dos 50 anos.
Um era de origem togolesa e estava integrado no clero e na diocese de Langres (300 Km a sudeste de Paris).
O outro era da diocese de Metz, mais a norte, e trabalhava em Aumetz, região de antigas minas de ferro, uma zona deprimida socialmente por razões econômicas e sociais, como caracteriza o bispo de Troyes, dom Marc Stenger, que conhecia ambos.

“Era um padre muito dinâmico e inventivo, criativo e entusiasta”, diz dom Stenger.
“Quando tomei conhecimento de que ele tinha se suicidado, foi como se o céu me caísse na cabeça”, acrescenta o bispo em entrevista.

Já em 2018, no final do verão, tinha havido dois outros casos de suicídio de padres na França.
Em julho último, soube-se também de um padre chileno que pôs termo à sua vida.
No Twitter, dom Stenger comentou: “Eram pastores entregues ao seu ministério. Então, porquê? Teremos nós, os responsáveis, entendido o seu sofrimento?”.

Na entrevista, dom Marc Stenger acrescenta:
“Ao tomar conhecimento do segundo suicídio, pensei imediatamente no que o bispo Lebrun tinha dito, após o [suicídio] de Jean-Baptiste Sèbe, um padre da sua diocese, há dois anos:
‘O que eu não fiz? Será que ouvimos o seu grito?’ (…)
O que me leva à pergunta seguinte: não estamos tão preocupados com os problemas de administração da Igreja que já não estamos prestanção atenção suficiente às pessoas?”.

Leia a entrevista de Marie-Lucile Kubacki com dom Marc Stenger:

O que você pode nos dizer sobre esses dois padres que conheceu?

Um deles, o que se matou há poucos dias, foi ordenado em Langres, uma diocese vizinha.
Era descendente de africanos.
Como as nossas duas dioceses fazem várias coisas juntas, muitas vezes tive a oportunidade de encontrar com ele, especialmente na época dos retiros do clero, comum a ambas dioceses.
Quanto ao segundo, era um dos meus alunos no seminário de Metz, sua diocese.
Fiquei muito próximo dele e muitas vezes veio me visitar no diocese de Troyes.

Depois de ter sido sacerdote em Marly, foi nomeado vigário paroquial de Aumetz, na área das antigas minas de ferro, um lugar um tanto desolado, por razões econômicas e sociais.
Ele era um padre muito dinâmico e inventivo, criativo e entusiasta.

Quando soube que cometeu suicídio, foi como se o céu estivesse caindo na minha cabeça. Ambos estavam na casa dos cinquenta anos.

No Twitter, você escreve: “Em dois dias, soube do suicídio de dois padres que conheço, da mesma geração (na casa dos cinquenta). Pastores dedicados ao seu ministério. Por que? Nós, os líderes, ouvimos seu sofrimento?”

Eu acrescentaria uma terceira pergunta. Ao saber do segundo suicídio, imediatamente pensei naquilo que o bispo Lebrun havia dito, após o suicídio de Jean-Baptiste Sèbe, sacerdote de sua diocese, há dois anos: “o que poderia ter feito para evitar a tragédia? Nós ouvimos seu pedido de ajuda?”

A primeira pergunta que as pessoas nos fazem é se notamos algum nuvem cinza… O que me leva à próxima pergunta: acaso não estamos mais preocupados com os problemas de administração eclesial, que não prestamos atenção às pessoas?

Eu não questiono ninguém, esta reflexão está dirigida a mim mesmo. Devemos reconhecer que enfrentamos situações difíceis em muitas dioceses. Somos questionados por nossa consciência episcopal que nos interroga sobre nossa missão evangelizadora: como falar a todos os que estão distantes? Com que meios? É uma preocupação nobre! Porém, tendo a mente e o coração, tomados neste ponto por esta pesada carga, temos dado espaço e disponibilidade em nossas cabeças e em nossos corações para pensarmos em nossos colaboradores mais próximos?

A cerimônia de ordenação sacerdotal é clara sobre este assunto: os padres são os nossos colaboradores mais próximos, e digo isto sem qualquer sinal de clericalismo.
Certamente, estamos tentando colocar os leigos no caminho, e o papa Francisco faz bem em nos lembrar que a Igreja é feita por todo o Povo de Deus e não apenas pelo clero, mas os padres são, no entanto, nossos colaboradores mais próximos. Ainda temos tempo para pensar sobre eles?

Não estamos tão preocupados com os problemas da administração eclesial a ponto de não estarmos mais atentos às pessoas?

Os bispos deveriam ser aliviados da sua carga para que tenham maior disponibilidade para o cuidado?

Não sei… Porque o bispo deve cumprir a missão que lhe foi confiada. O que está em jogo é que ele deve entender que a missão não é somente dele. Na sua Carta ao Povo de Deus, o papa Francisco dá fortes indicações, diz aos cristãos que devem participar da missão da Igreja.
É menos difícil para o bispo assumir a sua missão se ele conta com a participação do povo, mas também deve permitir essa participação.
Não basta cercar-se de colaboradores de confiança, é preciso confiar também naqueles que são confiados sob nossos cuidados, confiar também no sacerdócio dos batizados, nos leigos.

O que isso quer dizer?

Vejo que muitos cristãos se preocupam com os padres e presto homenagem a eles por isso, mas será que os padres contam o suficiente com os leigos? Especialmente em tempos difíceis, sabem como se apoiar neles? Por vezes, persiste uma espécie de reserva, mas onde há relações sadias, onde os leigos perceberam a sua responsabilidade de participar na vida da Igreja, as coisas vão bem. Por outro lado, quando a distância permanece, quando os leigos se consideram “a serviço” do sacerdote, como você espera que o sacerdote possa confiar em quem trabalha com ele?

Estamos falando sobre um novo mundo após o confinamento, mas cabe a nós criá-lo por meio de nossos esforços.

O que os padres que você encontra lhe dizem sobre o sofrimento atual?

Os padres sofrem com a imagem da Igreja e com a imagem dos padres na Igreja. Sofrem porque as pessoas mais distantes não entram em detalhes: todos os padres são culpados dos abusos cometidos por alguns. Responder a esta acusação é inútil, porque a instituição também é culpada, deve ser admitida a responsabilidade institucional, e procurar justificar-se não muda a opinião pública.

Os padres também sofrem de um descontentamento um tanto geral, embora o confinamento tenha aproximado muitos padres dos cristãos – mesmo que os cristãos tenham se mudado e não tenham retornado. Durante a crise de saúde pelo coronavírus, muitos padres tomaram consciência do vínculo que os unia aos fiéis cristãos.
Um fato permanece: que sentido tem a Igreja para as pessoas? Há algo novo a ser construído nesse relacionamento. Estamos falando sobre um novo mundo após o confinamento, mas cabe a nós criá-lo por meio de nossos esforços. É uma missão estimulante. Gostaria de transmitir esta esperança aos sacerdotes e cristãos.

Esse entusiasmo era comum, ainda em muitos padres que puseram fim em suas vidas: o que poderia ter acabado com isso?

Este é o grande mistério. Isso pode estar ligado a quedas na tensão espiritual, muita solidão, muito cansaço, excesso de trabalho, funções pesadas… Existem antídotos: a oração, a fraternidade entre os padres e a proximidade com os leigos a quem somos enviados, o esporte, a vida social, as leituras. Mas cada um o administra à sua maneira. Não podemos dar conselhos gerais para todos. A lei canônica recomenda um mês de férias, mas todos administram seu tempo de acordo com o que vivem.

Não haveria uma reflexão urgente a se fazer em nível nacional para a Igreja da França?

Já estamos nos fazendo essa pergunta, mas ainda há trabalho a ser feito, é óbvio. Este não é o primeiro dos meus alunos a se suicidar, já aconteceu há 25 anos.
Tratava-se de um jovem sacerdote que acabava de deixar o seminário e acabava de ser nomeado vigário paroquial.
Ao mesmo tempo que era suplente e estudava direito canônico em Paris.
O reitor da época me disse que se levantava às 5 da manhã nos dias de aula para pegar o trem para Paris, tinha um ritmo digno de um condenado… Ser padre é uma coisa linda, uma vocação… O desespero de um padre é algo particularmente triste: algo bonito se danifica e todo o corpo sofre.

Entrevista publicada originalmente em La vie e traduzida por Ramón Lara

Fonte: Sete Margens/ La vie/ Dom Total

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